quarta-feira, 10 de junho de 2009

O que sobrou de ti

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Ontem vi tua sombra a vaguear madrugada a fora. Desgraçada.

Pude perceber que praguejava. A vi vacilar sem rumo, embriagada. Murmurava blasfêmias.

A amargura era tamanha que me preocupei.

Pensei em abordá-la, mas desisti. Eram insanos os passos que dava. Era um vulto assustador.

O vislumbre dos pés que aportam no inferno.

Era a sombra perdida, distante de algo que poderia ter sido.

Entendi que ela havia abortado um capitulo de tua vida.

E lamentava o funeral de algo que não mais poderia.

Ela definitivamente adoecera no instante em que se atirou.

O aborto trouxe o fim antecipado de qualquer vislumbre matinal...

terça-feira, 9 de junho de 2009

Poeminha IV

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O princípio e as coisas que reluzem

Percebo minhas palavras viciadas,
cheias de asco
engripadas
sem a leveza que me supõem, deveria existir.
Mas quem teve a idéia da leveza?
E quem inventou que a vida deveria ser simples?
As coisas, eu poderia pensar, não acontecem como deveriam acontecer...
Mas acontece que não sei de onde trouxeram a idéia de que tudo deveria ser...

sábado, 23 de maio de 2009

Queridas divagações

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Terminei de jantar e sentei-me em frente ao computador. 19:40. Calculei que vinte minutos seria o suficiente para que eu pudesse ir ao banho. Isso em razão de que, como uma mulher vaidosa, preciso dessas duas horas para estar pronta às dez. Vinte minutos procuro o que fazer. Tudo bem, provavelmente homens virarão os olhos com desdém, ou talvez com o simples comentário "mulheres"... Mas sou da seguinte opinião: homens que gostam de mulheres rápidas gostam de mulheres feias...
Nós, as vaidosas, precisamos de tempo... Em realidade, quando sabemos que vamos sair, desde o primeiro segundo começamos a pensar no que vestir. Examinamos todo o nosso guarda-roupa mentalmente, fazendo diferentes combinações de peças, maquiagem e assessórios. E pouco importa quanto tempo falta para esse momento em que iremos sair. Pode faltar até mesmo meses. Pra exemplificar esse questão, basta que pensem no vestido de noiva, que a mulher já idealiza quando criança, sem fazer a mínima idéia até mesmo se irá se casar. É apenas o sonho de ser importante, de ser uma mulher importante, A Mulher.
Então, na noite de sair, pensamos também qual perfume será o melhor. O mais sensual, extrovertido, misterioso... O penteado... Tudo depende das intenções, das fantasias. Por isso quando um homem diz que as mulheres se arrumam para as outras, estão errados. Nós, as vaidosas, queremos resplandecer no olhar desse homem que nos fascina. Queremos que sintam orgulho de nos ter ao lado. Queremos também que eles se sintam importantes...
Bom, dizia que aguardava o tempo passar (os vinte minutos) para dar inicio a maratona deliciosa de produzir-me. Tomar um belo banho com o sabonete que deixa a minha pele mais macia... Lavar meus longos cabelos... Depois secá-los e sentir o aroma que dele exala. Olhar no espelho, ver a tela que é o meu rosto e brincar de artista. Pintar-me com as mãos de Pintor. Tentar criar harmonia no que de fato é desarmônico por natureza, natureza humana. Quando pequena eu já me maquiava. Era mágico. Me pintava e me via linda com as tonalidades de vermelho espalhadas pela face. Me sentia artista. Não era chegada a brincar de bonecas. As bonecas pareciam sempre dormir. E eu era apaixonada por coisas vivas, um universo imenso. No interior, eu brincava descalça pelas ruas e vestida de fantasias... Tinha sacolas cheias de panos, roupas, e fantasias... Saía pela cidade assim... Me sentia uma bruxa. Sempre gostei de ser a bruxa. Aquela que tinha o poder. Raramente as fadas. Sempre a bruxa. Todo dia era essa mesma brincadeira, com diferentes fantasias. Brincava no jardim, no pomar, na praça, conversava com as árvores telepaticamente. Eu vivia na floresta. E lá na floresta era tudo encantado.
Houve um momento em que tudo isso se esvaiu. Até meu espelho tornou-se vazio. Joguei a maquiagem fora. As transformações me fizeram bruta. Mas isso já é também passado, e um tempo obscuro... Agora estou eu aqui, olhando o relógio para meu ritual particular. E gosto de me fazer escutando música obscura. Música poderosa. E nessa espera lembrei-me de algo que me fez rir de leveza... Lembrei dos dias de piscina. Eu almoçava e assim queria logo voltar a nadar. Peixe. Mas minha mãe dizia "Não pode agora! Precisa esperar pelo menos 20 minutos!" Esperar, pois caso contrário seriam graves as consequêcias... Era a tal da congestão... Não havia mesmo saída, eu morria ali esperando... Ou morreria de fato, nadando...
Isso era pra mim o inferno! Como esperar?! A água ali, azul, tão molhada, e eu fora dela! Não era justo. Vale ressaltar que isso não ocorria sempre, pois na maioria das vezes eu nada comia, pois não queria perder tempo comendo. Eu queria mesmo evitar esse intervalo de meia hora que era tão torturante! As outras crianças lá dentro e eu perdida, sem rumo, sem diversão. Vinte minutos, meia hora não tinha fim. Era quase obsessão. Não havia criatividade para pensar em outra coisa. A minha criação estava lá dentro e assim o tempo era infinito. Hoveram vezes em que ousei desafiar... Quando me lembro disso, penso em como esses mesmos minutos hoje passam num piscar de olhos. Encontro tanta coisa pra pensar em meia hora que acabo por ultrapassá-la. O Corpo mudou; internalizei o universo.
Eu já era naquele tempo adepta aos rituais. Intensamente ligada às coisas que me apaixonam. Impregnada de imensidão. Cheia de mergulhos. No meu mundo de fantasia e azul eu já sabia que não poderia mudar. Que tudo em relação à vida é uma floresta encantada, uma piscina imensamente azul... E elas não podem esperar...

quarta-feira, 20 de maio de 2009

O cinismo justificável (desconstruindo a ética)

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É perspicaz atormentar o outro com a inteligência.
A fraqueza e a burrice nada conquista senão piedade.
E a piedade é patética, no sentido vulgar da palavra.
É também de grande valia usar a perspicácia para provocar.
Captar o doente das idéias pelo que mais anseia: pensar.
É sádico. Entretanto, não deixa de ser caridade.
É mostrar ao faminto a direção de seu alimento.
O instrumento é o incômodo.
Colocar o dedo na ferida narcísica.
Trata-se de dar suporte à loucura, e não ir contra a ela.
Instituir a discórdia é instigar a criação.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Febre Pagã

Febre Pagã

Eu poderia te amar.
Amar tuas palavras.
Poderia dar-te beijos doces e amargos.
Poderia mordiscar-te os lábios.

Eu poderia te amar.
Amar tuas insígnias...
Poderia colorir-te os lábios.
Poderia lamber-te a alma.

Eu poderia te amar...
Com o amar dos olhos fechados...
Com o amor da loucura...
Revestida de flores e procuras...

Eu poderia te amar.
Dar-te-ia pecados...
Servir-te-ia às instruções de Baco...
Far-te-ia romano...

Neurose, arte, frutos

Já experimentei infligir a dor na minha pele. É uma sensação curiosa e perigosa. Causar em mim a dor... Ser o meu algoz... Curiosa sensação de poder. É perigosa sensação de prazer. Escolher sofrer e poder controlar. Prazer na dor. É o gozo.
No gozar brota o impensável. Jorra a poesia, desarranja a ordem, contamina a realidade de incertezas...
É a loucura da transgressão. A mais individual das transgressões e por isso inculpável...Isso sim é transgredir a ordem, o óbvio... Se a crença é de que o prazer é constância, eis que o Mestre disse que o prazer é fruto também da desordem, do caos interno. Isso é revolucionar o raso.
É a arte fruto do caos... E se engana aquele que se julga diferente de mim. A consequência oriunda do gozo de cada um é diversa, assim o que se faz com o gozo é particularmente intrínseco à economia individual. O meus caos me transporta à um mundo de insanidade que me satisfaz. Com a dor na minha pele, produzo coisas que apaixonadamente preciso tocar. Outros apenas reclamam e repetem...
Os que se julgam além do corpo podem se decepcionar. Dentro de todos mora o masoquista... E fatídica-mente o sádico...

domingo, 17 de maio de 2009

Poeminha III

Agressão

Quebrei a escova de dentes.
Queria manter a boca suja
profanar os hipócritas.

Poeminha II

Sempre raso

Não se pode mergulhar em águas mortas.
Se está sempre raso...
Cultura não há.
Não se pode encontrar vida em águas mortas.
Lá no fundo nada é possível.
Suspensão, flutuar.
Onde não se pode mergulhar, não se pode querer...
Se está sempre raso.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Confissões II

Sou uma pessoa chata. Não sei se é bom ou ruim querer sempre estar comprometida com a verdade. É fato para mim que a verdade é algo simples, sereno. Sobre a verdade não há segredo. Ao menos pra mim isso é conceito cru, puro. Sobre a verdade basta sentir, viver. A verdade é uma só: é aquela que nos guia ao melhor caminho, não o certo ou errado, mas o melhor.
Porém isso trás complicações, obviamente. A antagonista do tema, a grande vilã: a mentira.
Ah! A mentira! Essa sim é complexa... Começo por dizer a frase mais clichê à qual poderia recorrer:
-Se dissesse que não minto estaria mentindo.
A frase é sim banal. A banalidade dessa frase indica algo curioso sobre a mentira e que a diverge (cômicamente) da verdade. A verdade é única, a mentira é multifacetada. Existem vários graus de mentira. Contamos uma mentirinha, mentira ou mentirão e assim as relacionamos com a culpa. Se a culpa é pequenina, é apenas uma mentirinha; culpa média, mentira; extremamente culpados, mentirão. Entendo que a mentira seja sempre egoísta. Não há mentira para proteger o outro. Há mentira apenas para se proteger. Quando algo é para proteger o outro entendo como omissão. Pode até ser um modo sutil de me safar da culpa dizer isso.
Ocorre que ao contrário da verdade, que porta a coragem e a bravura de não temer perder qualquer que seja o objeto, a mentira é carregada do que é vil, pois se teme perder. A mentira habita e domina o covarde, aquele que teme o outro em qualquer forma e que teme principalmente, fundamentalmente a verdade que há dentro de si.
A minha relação com a mentira é dúbia: sei que pela minha condição humana estou também sujeita a mentir, e por assim dizer, em ocasiões eu minto. E ao mesmo tempo repugno a mentira. No entanto parto do príncipio de que se ter consciencia de que a mentira pode surgir no decorrer da vida não me torna mentirosa. Meu compromisso é com a verdade sobre a vida, sempre buscá-la. Entendo que na vida nada se constrói com base na mentira. A mentira é feita de matéria tosca, pobre... Isso não é estrutura, nada sustenta.
Certa vez ouvi uma frase curiosa, dizia que as vezes é preciso contar algumas mentiras para se dizer uma verdade... Certamente discordo. Uma mentira só, ou a soma de mentiras jamais resultará em verdade. É uma equação impossível. De dentro de uma mentira não sai verdades. Entretanto posso entender que o inverso desta afirmação é compreensível. Acredito que as vezes é preciso dizer umas verdades para se contar uma mentira. Quando se conta uma verdade, e outra, e outra, o sentido é tão puro e limpo que se perde o controle. As verdades quando ditas podem resultar em mentira. Creio que essa é uma das formas em que eu minto. Falo a verdade uma, duas vezes, e por consequência já me peguei por perceber que no fim das contas o resultado já não era mais o programado. Já não era mais verdadeiramento o que queria dizer.
Posso dizer que a verdade e a mentira possuem isso em comum: a falta de controle. Mas quando se conta a verdade pode-se ter na carne a certeza de que o compromisso com a nobreza foi mantido. O que é nobre é a determinação de caráter. Caráter é o distintivo do ser, é aquilo que nos apresenta, é o que nos mantém... Por isso o que nos mantém deve ser feito de material nobre. Senão a casa cai...

Confissões

Se existe algo de que me envergonho é a covardia. Não direi que sou a mais brava das bravas... Assumo aqui meus momentos covardes.
Quando me deparo com a covardia a pulsar, envenenar-me, me escondo.
Me escondo na escuridão da fortaleza que venho construindo por séculos...
Não poderia permitir aos outros que vissem tal imagem. A pele seca, olhos fundos, ausência da voz. A covardia é o pior dos vícios.
O completo covarde sorri cinicamente, sem saber do que verdadeiramente ri. O cinismo é resultado imediato do não-saber. Mas não-saber não é covardia; covardia é ignorar a verdade, a verdade de que nada se sabe.
De olhos bem abertos fico assustada com a minha própria fraqueza e assim, para ignorar, procuro a escuridão. Se assim permaneço me repugno cada vez mais. O castelo é duplo em seu destino: Glórias e Tragédias. Cabe ao Rei escrever a estória.
Se digo que me envergonho particularmente desse aspecto da minha humanidade é por entender que o covarde tenta fugir de sua saga. E para mim é impensável uma vida pequena... Assumo meus momentos covardes, mas estou aqui nesse não-saber exatamente para aprender, apreender. E deixo as espadas talharem pedaços e pedaços de meu couro, e com o viço da coragem criam-se desenhos mais belos de se apreciar.
Dentro de mim não cabe covardia e coragem. Não há espaço para que coexistam; assumir não significa admitir. Momentos de fraqueza tornam o guerreiro mais forte... Envergonhar-me é o indicador, o aviso de que este caminho não é o meu. Meu caminho é obscuramente épico.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Olhos de sépia

Existem pessoas que são incomuns. Pessoas com um incômodo constante dentro de si. Pessoas que para elas não basta saber que as coisas existem, isso é pouco.
Pessoas incomuns. Elas questionam. Espertas, sabem que encontrar a resposta é uma incumbência de ordem moral, imposta de si para si mesmo, e que provavelmente não trará uma resposta fechada, una. Para elas não basta estar, é preciso exercitar o prazer que é sentido na curiosidade.
Para os incomuns, uma palavra é muito mais que um sentido apenas. É uma palavra um universo infinito de sentido e sensações. A palavra tem cheiro, sabor, textura, melodia, cor... E algo mais que transcende e que não se apreende. A palavra possui um buraco; paradoxalmente o incomum busca preenchê-lo com a própria palavra.
A Saudade é palavra ordinária... Conta um pouco do mundo desses estranhos. Estranhos seres nostálgicos que enxergam o mundo, a vida, as relações de modo diverso. O nostálgico possui olhos amarelados, não se sabe nunca se felizes ou tristes. Olhos de sépia...

domingo, 1 de março de 2009

Poeminha

Sobre a virtude

Não me diga que não há mais castelos.
Eu sei que há.
Castelos e castelos.
Não me diga que não há mais luta.
Eu sei que há.
Ainda há guerra, sangue correndo.
Rios e rios.
Rios vermelhos...
Nego o fim da epopéia.
Não me diga que não há mais guerreiros...

sábado, 28 de fevereiro de 2009

O Mineiro

Ele estava andando pela estrada em passos lentos... Era de manhã bem cedo. Podia sentir o cheiro úmido e verde do mato. Já era final de verão, e as noites já são mais frescas nessa época do ano. Observava cada detalhe daquele chão em que pisava. A terra vermelha, fofa, quase molhada. Andava sem direção. Não havia tido um bom sono. Precisava fazer o desjejum com uma dose de aguardente, isso era tudo que sabia.
Continuava a andar, devagar, e ia a refletir sobre sua existência, sobre suas raízes. Sempre apreciara o fato de nunca ter querido sair daquela terra. Não compreendia bem o que o prendera ali por tanto tempo. Sabia da imensidão do país, mas nunca fora atraído para qualquer outro lugar. Lembrou-se que a venda mais próxima estava ainda a alguns quilômetros, mas não se importou, não tinha pressa.
O mineiro observava tudo a seu redor. A estrada de chão o levou ao alto de uma colina de onde podia ver ao longe, em meio as montanhas, uma árvore resplandecente, encantadora. Conhecia de cor aquela imagem: era o Ipê amarelo. Lá estava imponente, um ponto de luz que brilhava na terra ao refletir do sol como as estrelas brilham no céu. Sentiu-se mais uma vez orgulhoso. Decidiu-se por sentar um momento. Fora tomado de paixão. Estava vidrado na simplicidade bucólica que se apresentava. Realmente Deus fora generoso com ele e com o lugar. Ele percebeu que só poderia ser um privilegiado por estar ali, por ter sido criado descalço em meio a toda aquela beleza.
O Homem sentiu no peito que ser mineiro era ser bicho diferente... O mineiro é quieto, calado à primeira vista. Tem a desconfiança estampada na face. Mineiro cheira as coisas antes de tocar, antes de comer. Mineiro não é bicho muito curioso, mas se descobre que é bom, vira freguês. Quando passa a conhecer o estranho, sente-se a vontade e conta toda a sua vida. Recebe em sua casa para tomar um café da tarde na cozinha, com direito a queijo, bolo de fubá e café. Ele quase pôde tocar o cheiro de café no ar, que emanava de suas lembranças. Pensou em seu pai. O pai todas as tardes voltava da roça e se sentava na varanda da casa. Tirava do bolso o fumo de rolo e o canivete, então punha-se a picar. Depois pegava a palha de milho seco, que parecia uma flor amarelada e velha. Arrancava uma pétala e com o canivete cortava um retângulo. Enrolava, passava a língua para umidecer a palha e grudar, e então acendia com um fósforo. Chamava a esposa para que lhe trouxesse o café ralo e doce de que tanto gostava. Assim era todos os dias. O ritual de seu pai. Compreendeu que esse povo é sim dado a rituais, o que reflete ser também um povo católico. Mas para além da igreja a fé esteve sempre na terra, os rituais sempre foram pagãos. Nada mais pagão que amar os cinco sentidos, ter prazer em plantar e colher. A imagem de seu pai sempre fora a de um homem soturno, mas que nunca deixara de amar os filhos, ensinando-os toda a lida da roça e da vida. Assim é o mineiro, age com amor. Fala o que precisa falar. Não desperdiça palavras.
Sentado ali fazia quase uma hora, perdido em suas divagações, foi chamado subitamente à realidade quando passou em sua frente uma capivara e suas capivarinhas. Sacudiu a cabeça e percebeu que estivera voando por mais de meia hora. Sorriu. Olhou mais uma vez as montanhas. Disse para si que mar de minas são as montanhas. Mineiro não nada, voa. Mineiro imagina. Levantou-se e pôs se a andar. Caminhou por mais meia hora e encontrou a venda. Colocou-se de frente ao balcão e pediu ao José que lhe trouxesse a pinga. Bebeu. O prazer fora tremendo. Ordenou mais uma. A sensação era carnal. Compreendera mais uma vez que fora plantado ali. Que seus pés eram raízes plantadas naquele chão... Ficou a imaginar o pão de queijo que sua mulher prepararia durante a tarde. A embriaguez do mel viera rapidamente. Foi o mineiro tirar um cochilo debaixo da goiabeira, tendo a certeza de que passara o tormento da noite. Não saberia dizer se tudo aquilo era felicidade, mas a serenidade era parte de seu ser...

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Mais do mesmo...


Falar sobre o tempo é lugar-comum, e assim o é pois se trata de uma experiência comum a todos. Logo todos falamos sobre ele. E falar sobre algo tão falado pode parecer tolice, falta de assunto... Mas o tempo é assunto eterno, atemporal. O que não se pode explicar é infinito, infinitamente intrigante.
Se engana aquele que pensa que o tempo passa... Quem passa somos nós. Quanto maior o espaço, maior o tempo. O Tempo está, nós somos. O Tempo está infinitamente, e nós somos por apenas um minúsculo período. Nosso tamanho, diante de todo o universo, beira a insignificância caso não tomemos parâmetros. E é para não sermos insignificantes que escolhemos o Outro como referência.
Todos os outros seres desse planeta apenas estão, o que os torna ideais. Eles podem até não serem eternos, mas eles não precisam de parâmetros para sustentar a sua existência. Esses seres apenas vivem, não falam. Por não falarem eles desconhecem o Tempo em seu sentido mórbido. O Tempo para esses é lugar, lugar é espaço e espaço sem referência é eterno. O Tempo está para nós pois o questionamos. Questionamos a nossa existência e queremos sempre mais.
Por mais que tentemos a nossa eternidade, por mais que criemos teorias para nossa eternidade, sempre nos restará a dúvida. Somos animais feitos de dúvida. Coisa só nossa. E esse que dúvida é o ser que sabe que não se pode segurar o tempo em suas mãos. Nossa mão é pequenina e o Tempo é imenso, não nos pertence.
Não há como eliminar o Tempo, apenas nos eliminar. Iremos e tudo continuará por aqui, universo além da imaginação. E dizer que o Tempo é lugar-comum é provar a sua espacialidade. Localizamos o tempo em nossa fala. E quanto mais dele falamos, mais perguntas teremos...

A hora da chuva

Me espera um pouco mais, vou correr na chuva. Refrescar a cabeça, umidecer o corpo, lavar a alma. Rodopiar. Provar da forma mais livre de amar: a loucura.
Me espera querendo, a imaginar. Vou dançar a liberdade, num só fôlego. Escutar a sinfonia das gotas. Voar sobre a terra lavada. Olhar de longe a beleza do nada. De longe nada existe e nada faz mais sentido do que o nada existir.
Me espera, pois dessa corrida voltarei mais bela. Voltarei mais limpa pelas águas geladas que atravessarei. E minha pele estará mais doce. E meus olhos menos vermelhos. Mas eu preciso correr.
Me espera... Sou apenas uma. Mais uma. Uma, empenhada nessa saga em construção. Vorazmente capaz de querer, voraz-mente em busca de ser livre. Livre de todos e quaisquer que sejam os julgamentos, pois o julgamento limita a corrida.
Me espera. Eu não tenho medo de sair na chuva. Vou lá gritar alto, tão alto para que Eu possa ouvir... Para que eu entenda um pouco mais de mim.
Vou refrescar a cabeça, umidecer o corpo, lavar a alma...

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Sobre a beleza...

Viver intensamente é mergulhar na imensidão. É fechar os olhos e sentir os prazeres possíveis. É ter todos os sentidos aguçados pela experiência da vida. Saborear, degustar o profundo sem vacilar.
Viver intensamente é ter coragem, é ser nobre. É ter alma de aventura. É não ligar para o tempo. Intensidade é coisa de alma que brilha. Viver a intensidade é coisa de alma corajosa.
Ser corajoso é buscar a verdade dentro de si, a vontade do seu próprio desejo. É ter equilíbrio no olhar, saber enxergar de dentro pra fora e de fora pra dentro.
Ser corajoso é ser antitético, ter medo mas enfrentá-lo. Usufruir das fontes mais regozijantes. É saber que dessa mesma fonte brota a dor. Saber que pela dor se vai mais fundo, se dirige ao desconhecido.
Ser intenso é viver brava-mente. É estar envolto em estrelas. Sentir as estrelas. Tocar as estrelas.
A intensidade é expansão. É prolongar o corpo ao universo. Possibilitar infinitas experiências. A intensidade é sensatez, pois é bom gosto.
A intensidade é amar o Ser. O Ser é ter coragem.